Festa no acampamento Dom Tomás Balduíno comemora 3 anos de resistência no Paraná

Organizado pelos moradores do acampamento em um ano de trabalho, atividade é a maior do MST neste ano

Frédi Vasconcelos | Brasil de Fato | Quedas do Iguaçu (PR)
Em solidariedade ao Lula, preso político, moradores e visitantes do acampamento colocaram máscara em manifestação de apoio ao companheiro - Créditos: Laís Melo

Em solidariedade ao Lula, preso político, moradores e visitantes do acampamento colocaram máscara em manifestação de apoio ao companheiro / Laís Melo

No sábado (07), o acampamento Dom Tomás Balduíno, em Quedas do Iguaçu-PR, teve a maior comemoração do ano realizada por militantes do MST. Num local que é símbolo de resistência, moradores se auto-organizaram por mais de um ano para fazer um evento para cerca de 10 mil pessoas, comemorando os três anos de existência do acampamento no território. Mística, ato político, apresentações culturais e um grande almoço foram oferecidos. Cada uma das 600 famílias que vivem lá contribuiu, nesse período, com 10 quilos de carne, complementadas por outras doações. Em cada uma das oito cozinhas organizadas, todas com o nome de uma personalidade, como Marielle Franco, Tchê Guevera, Comandante Chávez etc., trabalharam cerca de 100 pessoas.

Foto: Giorgia Prates

O ato político e festivo contou com a participação de políticos, como os senadores Gleisi Hoffmann (PT), Roberto Requião (MDB), lideranças do MST, representantes da igreja católica, de universidades, entre outras.

Na abertura, o Frei José Fernandes, que conviveu com Dom Tomás Balduíno até seus últimos dias, lembrou que ele era um homem de grandes articulações e de pequenos atos, como defender os sem-terra, os indígenas, lutar contra o latifúndio, ao mesmo tempo que cuidava do jardim da casa em que moravam. Pedindo o coro de todos presentes, Frei José repetiu uma frase de Dom Tomás: “Direitos humanos não se pedem de joelhos, exigem-se de pé”.

O professor da PUC-PR e ex-procurador geral do Estado, Carlos Frederico Marés, lembrou que nessa região do Paraná a luta pela terra é uma questão centenária. “Aqueles que entregaram títulos falsos tentam nos fazer esquecer essa luta. Aqui já cultivamos nossos mártires, adubo que nos faz levantar cada vez mais. A terra pertence a todos e só quando todos usam ela faz sentido para a sociedade”.

O senador Requião, depois de afirmar que o assentamento é exemplo por sua organização e resistência, também lembrou que as terras onde está pertenciam à União e foram griladas pela família Giacometti, revendida à companhia Araupel e agora ocupada pelo MST. “A Araupel, quando comprou essa terra, sabia que era roubada. E quem compra mercadoria roubada perde sem receber nada. Onde houver terra desocupada e improdutiva, só se aceita título de propriedade assinado por Deus e com firma reconhecida. Terra improdutiva tem de ser ocupada”.

Já a senadora Gleisi Hoffmann lembrou que há pouco tempo estave numa praça de Quedas do Iguaçu em ato pela morte de dois acampados assassinados. “Leonir e Vilmar são companheiros que tombaram, mas enfrentaram a Araupel, mostrando que a reforma agrária é possível e necessária”, disse. E lembrou que o Brasil passa por um momento decisivo, que é a eleição de outubro deste ano: “Será determinante para enfrentar os problemas brasileiros, como a fome que está voltando e a falta de políticas públicas para o campo e a cidade. A única opção é fazer com que Lula possa ser candidato e governar de novo o Brasil. Não prenderam porque ele cometeu crime, mas porque representa o povo brasileiro, a esperança. Se deixar solto, ganha a eleição e desmonta o que eles fizeram”, concluiu. No que foi complementada pelo senador Requião. “Assino embaixo do que Gleisi disse. Lula não está preso. É um ex-presidente nacionalista e popular sequestrado pelos interesses geopolíticos de outros países. Continuidade e resistência vão libertar Lula de seu sequestro.”

Já João Pedro Stédile, do MST, disse que depois das últimas vitórias na Justiça o acampamento já pode trocar as placas da entrada por Assentamento Dom Tomás Balduíno. E lembrou a visita que fez ao ex-presidente Lula na última quinta-feira. “Na situação em que ele está a gente fica constrangido, não sabe se abraça ou chora, mas o homem (Lula) está com tanta energia de entrar em campo, que já começa a puxar assunto sobre política. Ficou falando uma hora e eu só anotando. Disse a ele que vinha nessa atividade e ele pediu para dizer para cada militante do MST que na batalha contra golpistas os primeiros companheiros nessa luta são do MST, a quem deve eterna gratidão. E, quando voltar, não vai brincar de reforma agrária. Vai fazer reforma agrária de verdade, doa a quem doer”, relatou Stédile.

Edição Jaine Amorin
Ceagro participou da festa e assessorou através do Projeto "Direitos Humanos: das Violações a conquista da Reforma Agrária" apoiado pelo 

Prefeitura de Rio Bonito do Iguaçu é ocupada por Acampadas(os) e Assentadas(os) do município

Por Jaine G. de Amorin
Fotos: Thiarles França/MST

No dia de ontem (23/04), por volta das sete horas da manhã, cerca de 500 agricultoras(es) acampadas(os) e assentadas(os) ocuparam a prefeitura municipal de Rio bonito do Iguaçu.

Segundo os manifestantes, a ocupação é decorrente do descaso da prefeitura com os acampamentos do município. A pauta de reivindicações é por direitos básicos que são negados pelo poder público municipal, especialmente relacionados à saúde e educação. Segundo Toni Escobar, coordenador da escola Itinerante Herdeiros do Saber e acampado no Acampamento Herdeiros da Terra de I de Maio, várias reuniões foram realizadas com a atual administração, porém os acordos firmados  nunca foram cumpridos.

No início deste ano, a prefeitura iniciou serviços de melhoria das estradas que dão acesso ao acampamento, onde se localiza a Escola Itinerante Herdeiros do Saber, mas não concluiu as obras. As péssimas condições das estradas  impedem que os educadores(as) possam chegar, em dias de chuva, até a escola. Reformas para a escola solicitadas à prefeitura também não foram efetivadas. O descaso com a saúde também é grande, pois não é mais disponibilizado atendimento médico no acampamento, o que dificulta o acesso à saúde para as famílias acampadas. As péssimas condições das estradas também dificultam a locomoção de entrada e saída do acampamento, o que leva a uma demora no atendimento em casos urgentes de saúde.

A prefeitura segue ocupada por prazo indeterminado e as aulas da escola itinerante estão sendo realizadas no local. Escobar ainda comenta sobre a formação pedagógica que os estudantes estão tendo em frente a prefeitura “A escola Herdeiros do Saber participa ativamente da mobilização, pois e a perspectiva e o projeto de escola itinerante  deve estar onde estão as famílias”.

Todas as atividades pedagógicas das turmas, tanto do turno matutino quanto vespertino, estão ocorrendo em frente à prefeitura, juntamente com apresentações e manifestações dos estudantes que erguem faixas pedindo melhorias na educação.

Também no dia de ontem, os manifestantes participaram da seção ordinária na Câmera de Vereadores onde um  projeto de lei de autoria do executivo foi votado e aprovado por unanimidade. O Projeto permite a execução de melhorias das estradas que dão acesso ao futuro Assentamento Herdeiros da Terra de Primeiro de Maio.

 

Revisado por Luis C. Costa
Trabalho de Assessoria de Comunicação realizado com apoio

A construção das Escolas Itinerantes: A educação no MST

Matéria Também Publicada no Jornal Impresso Terra Vermelha

Por Jaqueline Bueno

As Escolas Itinerantes são construídas em espaços de luta e resistência do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Essas escolas possuem como intuito garantir os processos de educação em espaços de disputa, os acampamentos. Com organização e coletividade garantem as condições necessárias para que toda criança tenha acesso a escolarização desde a educação infantil até o ensino médio.

Com isso, Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), ao longo dos seus 34 anos de história, vem se propondo a construir uma educação que perpasse o âmbito formal da escola pública. Além disso, as Escolas Itinerantes foram criadas para que acompanhassem a luta das famílias e seu movimento.

Foto: Danielson Postinguer/Comunicação-MST

Além, de serem frutos da necessidade concreta de ter condições de acessar o conhecimento historicamente acumulado, justamente no espaço em que vivem, também foi possível construir uma própria pedagogia em pensar os processos educativos.

Desse modo, as Escolas Itinerantes fazem parte do MST, porque cultivam práticas e concepções de educação que se aproximam dos seus objetivos de luta. Logo, trazem o vínculo com a “Pedagogia do Movimento” e, esta que, por sua vez traz reflexões específicas na sua concepção de educação com “base histórica, materialista e dialética para a qual é preciso considerar centralmente as condições de existência social em que cada ser humano se forma” (FREITAS, SAPELLI, CALDART, 2013, p.12).

Além da proposta curricular experimentada atualmente, chamada de Complexos de Estudo, as escolas de acampamento possuem uma dinâmica de organização que está em sintonia com os princípios do MST, por uma concepção de educação alicerçada na formação de lutadores e construtores de uma nova ordem social.

Foto: Danielson Postinguer/Comunicação-MST

As Escolas Itinerantes são autorizadas institucionalmente pelo Estado. A primeira escola de acampamento surgiu no estado do Rio Grande do Sul no ano de 1996, e alguns anos depois passaram a funcionar em mais cinco estados brasileiros sendo estes; Paraná (2003), Santa Catarina (2004), Goiás (2005), Alagoas (2005) e Piauí (2008). Mas, destes estados citados acima, apenas o Paraná e o Piauí, possuem Escolas Itinerantes em seus acampamentos. No Paraná, foram legalizadas em 2003, pelo Conselho Estadual do Paraná (CEE).

Na região centro do Paraná, a Escola Itinerante Herdeiros do Saber foi construída em 2014, com a ocupação de um dos maiores latifúndios de terra em Rio Bonito do Iguaçu utilizados de forma improdutiva pela empresa Araupel S.A (madeireira de celulose). Em 2015, o MST ocupa o restante da fazenda que corresponde área dessa mesma empresa, mas em Quedas do Iguaçu e constrói a Escola Itinerante Vagner Lopes.

Essas escolas possuem forte vínculo com a luta pela educação do campo, pois consolidam em suas práticas pedagógicas o estudo da história, do trabalho, da cultura, da organização coletiva e da luta social. São práticas educativas que estão conectadas com a vida das crianças e da suas famílias, que buscam formar lutadores e lutadores de uma nova sociedade. Mesmo em condições precárias de estrutura física educam as crianças para a verdadeira vida. Desse modo, com organização e coletividade produzem saberes referente à sua realidade, porque “educação do campo: direito nosso, dever do Estado e compromisso da comunidade”.

Foto: Danielson Postinguer/Comunicação-MST

Trabalho de Assessoria de Comunicação Realizado com apoio